Alan Oliveira: “A informação correta e com credibilidade sempre será o melhor remédio contra a desinformação e o ódio”
Gleisi Silva
O jornalista da TV Bahia, Alan Oliveira, acredita que a confiabilidade pode ser resgatada se o jornalista redobrar os cuidados na apuração dos fatos. Com seis anos de experiências, nunca vivenciou algo parecido. Assim como o vírus, a desinformação tomou grandes proporções: “Foi um processo longo e difícil de explicar”. A credibilidade é questionada, “desgastada diante desses ataques e da disseminação de fake News”. O trabalho do jornalista precisou ser reinventado: “As entrevistas presenciais passaram a ser feitas via chamada de vídeo ou ligação telefônica. Os repórteres passaram a usar máscaras na rua. Nós passamos a não mais receber convidados no estúdio”.
Qual é o principal desafio do jornalista em meio à pandemia de COVID-19?
O principal desafio foi aprender a lidar com o número alto de situações que nos são apresentadas. Não que antes fossem poucas. Mas elas triplicaram. O cuidado na apuração sempre foi e tem sido ainda mais importante nesse período, diante de tanta desinformação plantada propositalmente. Algumas situações são falsas ou não necessariamente representam algo que em si corresponda aos critérios de noticiabilidade. Logo no início, choveram denúncias de pessoas nervosas, preocupadas e/ou pouco informadas sobre o que é uma pandemia, do que se tratava o vírus, como ele agia e como agir com ele. Tivemos muitas fake News. Os telefones não paravam. Se o vizinho espirrasse, ele estava com Covid-19 e não era o teste negativo que iria dizer que ele não estava, porque ele já tinha espirrado. Foi um processo longo e difícil explicar dia após dia todas essas coisas e ao mesmo tempo não deixar de falar o quanto era e ainda é importante manter o cuidado com relação ao vírus. Dizer que “olha, não é bem assim”, mas, ao mesmo tempo, deixar claro a gravidade da coisa e a necessidade de se cuidar e cuidar do próximo. Aos poucos, isso foi melhorando, mas não parou e as preocupações passaram a ser outras. Vieram as denúncias de estabelecimentos funcionando ilegalmente; as aglomerações; as dificuldades em se conseguir atendimento, diante de unidades de saúde lotadas; a deficiência em se conseguir contato com familiares internados em UTI; as trocas de corpos nos hospitais; as pessoas furando a fila da vacinação; a falta de vacina. Foram inúmeras situações e a cada dia surgem mais e mais. O volume de trabalho cresceu, as equipes reduziram com os plantões para evitar aglomerações e com os colegas afastados por testar positivo, e a gente precisa lidar com tudo isso, para fazer nosso papel enquanto imprensa.
Qual a principal função do jornalismo na pandemia?
Diante de tudo que estamos vivendo, acredito que a principal função do jornalismo é justamente ajudar a população com essas questões. Tirar as dúvidas, esclarecer as situações, ajudar a mostrar e assim resolver os problemas, fazer o contato entre as autoridades e a população, intermediar essa relação, e, acima de tudo, desmentir as notícias falsas, que tanto prejudicam.
Uma das principais características da prática jornalística é o contato com as pessoas. Porém em meio à pandemia, essa lógica precisou ser repensada. A saída para maior parte desses profissionais foi o home office. Como é feita a apuração dos fatos e/ou ir atrás das notícias trabalhando dentro de casa?
Tenho vivido de tudo um pouco durante esse período. No início, eu ficava direto na redação. Foi assim por mais de 6 meses. Depois, passei a trabalhar em home office e, atualmente, trabalho de forma mista. Uma semana estou em casa e outra na empresa. Então, peguei muito o começo de tudo e tive que lidar com todas as dúvidas e preocupações bem de perto. Vi as coisas sendo reinventadas bem ali na minha frente. As entrevistas presenciais passaram a ser feitas via chamada de vídeo ou ligação telefônica. Os repórteres passaram a usar máscaras na rua. Nós passamos a não mais receber convidados no estúdio. Era tudo muito novo. Essas ferramentas novas precisavam ser usadas diante do que estava acontecendo. Mas sempre mantendo a preocupação com a apuração correta dos fatos. Lembro que no início era muito estranho produzir essas reportagens todas feitas a distância. TV é feita de imagens. A gente precisava de imagens. Às vezes as chamadas de vídeo não eram suficientes. Precisamos contar com a ajuda das fontes, que enviavam vídeos. Elas eram e as vezes ainda são nossos cinegrafistas improvisados. Em compensação, as chamadas de vídeo também resolveram problemas que tínhamos com o fato de conseguir entrevistar determinadas pessoas, principalmente quando as necessidades de entrevista surgiam de última hora. Agora é muito mais simples iniciar uma entrevista com uma simples chamada.
Como a impressa conseguirá manter-se livre de ataques e ameaças vinculadas a desinformação?
Acredito que a informação correta e com credibilidade sempre será o melhor remédio contra a desinformação e o ódio. Mas, infelizmente, nossa credibilidade tem sido desgastada diante desses ataques e da disseminação de fake News. As pessoas estão confusas. Não sabem em quem/qual veículo acreditar/confiar. Outras estão cansadas/abaladas com as notícias. Nesse momento, a proximidade do público, o mostrar o que as pessoas estão enfrentando, o apoio nas comunidades, cobrar das autoridades retornos para problemáticas, entre outras coisas, se tornam ainda mais importantes. É não se deixar intimidar diante daquele que é nosso papel enquanto jornalistas. O nosso compromisso com os fatos.
Quais são as suas estratégias, como jornalista, de combate à desinformação no que tange ao combate ao coronavírus?
Como disse, tem sido difícil lidar com as notícias falsas e ou descontextualizadas e com os boatos. Tudo isso aterroriza as pessoas, às vezes revolta. Levanta questionamentos sobre coisas que na verdade não existem. E apurar tudo isso demanda tempo. Algo que a gente cada dia tem tido menos. Mas a apuração atenta sempre será o melhor caminho. Por mais corrido que o tempo seja, a dedicação nesse momento evita dor de cabeça futura. É saber de mais de uma pessoa/autoridade sobre a mesma situação. É o cuidado dobrado com o que se vai divulgar. Aqui colocamos em risco não só nossa credibilidade, mas as pessoas que vão consumir aquela notícia falsa que deixamos passar.