Yuri Silva: “A tendência é que esse jornalismo seja menos popular”

Melanye Vivian

Yuri Silva, Jornalista e ativista político.

Yuri Silva acredita que o jornalista precisa correr riscos. Com 26 anos, já esteve por 5 anos no “A Tarde”, foi o correspondente na Bahia de O Estado de S. Paulo e colaborou com veículos como The Intercept Brasil e revista Piauí. O atual coordenador de direitos humanos do IREE – Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa – e coordenador nacional do CEN  (Coletivo de Entidades Negras). defende a função do jornalismo político e ativista: “O papel do jornalista e do jornalismo político no enfrentamento da pandemia é a fiscalização do poder público.”

O que você percebeu, enquanto jornalista, que mais afetou o jornalismo e consequentemente os seus profissionais, em decorrência do surgimento da Codvid-19?

O que mais afetou o jornalismo e o jornalista em decorrência da COVID-19 foi o risco do jornalista perder a própria vida e as limitações físicas das medidas de segurança, das medidas sanitárias, que são tão importantes. Então, o jornalista perdeu o contato com as pessoas, com as histórias, com o povo. A tendência é que esse jornalismo seja menos popular, seja menos conectado com a realidade do povo em tempos de pandemia. Para que isso não aconteça, o jornalista precisa correr riscos, precisa estar em lugares arriscados, do ponto de vista sanitário. O jornalismo foi bastante afetado, afora as questões econômicas, financeiras, que afetaram e estão afetando as grandes empresas, o mercado. Isso obviamente influencia em postos de trabalho que são fechados. O impacto é muito grande no jornalismo.

Diante todas as restrições impostas em prol da segurança contra o novo vírus, qual a sua opinião sobre a produção e o consumo dos jornais atualmente?

O consumo dos jornais tem sido uma experiência sui generis durante a pandemia. Porque ao mesmo tempo que você enxerga a dificuldade nas páginas, de um jornalista produzir conteúdo conectado com a realidade das pessoas, você também enxerga, volta e meia, produções que são fruto da disposição jornalística, da disposição profissional, da conexão do profissional com a missão da profissão que é transmitir informação para quem precisa, para o povo. Então, as produções apontam isso porque demonstram que o jornalista correu riscos para fazer aquela produção. O consumo dos jornais tem sido diferente. Além disso, meio que todo mundo virou jornalista de ciência, todo mundo teve que se virar para aprender a falar, a falar sobre o assunto, o assunto não muito comum nas páginas dos veículos e um assunto difícil, extremamente especializado, extremamente técnico e que passou a dominar as páginas dos jornais.

Qual é a verdadeira importância da interatividade presencial para o fazer jornalístico e quais foram as maiores consequências dessa ausência? 

Na interação pessoal, física, o jornalista pode sentir ou deduzir a emoção da personagem, pode descrever o ambiente, que são elementos decisivos para uma boa escrita jornalística, para uma boa apuração. Todos esses elementos, são elementos que sofisticam o fazer jornalístico e a ausência deles tira essa sofisticação, essa qualidade do trabalho jornalístico, e isso é uma grande perda. Impede o jornalista de olhar olho no olho da sua fonte, de saber muitas vezes pelo gesto, pelo comportamento, se aquela fonte está falando a verdade, está omitindo, está aumentando. Tudo isso é uma capacidade que o jornalista desenvolve ao longo da vida profissional, no contato físico com a sua fonte, no contato físico com o fato, com a notícia. E a ausência do contato físico com a notícia é uma perda em todos esses sentidos.

É possível dizer que a utilização dos jornais digitais cresceu em contrapartida com o jornal impresso sobre as necessidades da sociedade?

Eu acredito que sim, acredito que o jornal digital ganhou o seu lugar na comunicação ocupando um espaço importante no mercado de um consumo de notícias. Porque o que a gente esperava que acontecesse há anos atrás, quando do boom da internet, está começando, na verdade, agora, a se dar de forma mais intensa. É bastante interessante ver como o jornal digital tem ganhado espaço e tem crescido. Inclusive, as versões digitais dos jornais impressos que apontam para uma nova forma de consumo, com menos contato físico com os objetos devido a pandemia.

Enquanto coordenador nacional do Coletivo de Entidades Negras (CEN), qual é o papel desse jornalismo político no enfrentamento da pandemia?

O papel do jornalista e do jornalismo político no enfrentamento da pandemia é a fiscalização do poder público. É apontar os caminhos que o poder público tem que percorrer para atender as demandas da população e fiscalizar se isso tem sido feito. O jornalismo mais do que dizer A ou B, tem que comprovar se A ou B realmente foi feito. O jornalismo político tem um papel essencial, o jornalismo de nicho, seja o nicho racial, feminista ou  de direitos humanos. É um jornalismo muito importante, para reflexão mesmo, sobre assuntos relevantes que muitas vezes não encontram espaço no jornalismo tradicional. Mas o jornalismo político em si, que faz parte do que a gente chama de  jornalismo tradicional tem um papel justamente de promover novos paradigmas, de reflexão da sociedade sobre o mundo político, sobre  a democracia, sobre o estado democrático de direito, que estão tão ameaçados no último período.

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