Novo Ensino Médio será implantado na Bahia em 2023
Por Luiza Raposo, Maria Eduarda Pinto e Maria Paula Magalhães
Depois de dois anos de escolas fechadas, em decorrência da pandemia, agora, em 2022, foi possível que as escolas estaduais dessem continuidade ao processo de transição para o novo ensino médio, que teve início em 2019. Diferente de outros 22 estados do Brasil, na Bahia a obrigatoriedade para a aplicação da nova base curricular foi adiada para 2023. O novo modelo propõe mudanças que favorecem a autonomia dos alunos e o incentivo ao projeto de vida.
O Documento Curricular Referencial da Bahia (DCRB) do Ensino Médio, que serve de referência para estabelecer as matrizes curriculares do novo modelo, foi aprovado pelo CEE – BA (Conselho Estadual de Educação da Bahia) em 2022. O documento, que segue as recomendações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), ainda vai passar pela homologação na Secretaria de Educação antes que qualquer alteração na matriz curricular seja feita.
A discussão sobre a implantação do Novo Ensino Médio no Brasil não é recente. Sendo formatada desde 2017, a reforma no modelo de educação brasileira busca aplacar as dificuldades encontradas nesta que é a etapa de ensino com o pior desempenho educacional e número de evasão escolar no país.
O cenário educacional do país diante desta mudança pode ser observado pelos seguintes números: entre 2020 e 2021, o percentual de evasão escolar no ensino médio duplicou, de 2,3% em 2020 e 5% em 2021, segundo o Censo Escolar da Educação Básica. Em relação ao Ideb, a educação pública não atingiu a meta de 5.2 pontos em 2021, ficando com a média de 4.9 em relação a toda a rede de ensino (estadual e federal).
A Lei nº 13.415/2017, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, estabeleceu uma mudança na estrutura do ensino médio. De acordo com o cronograma do Ministério da Educação, o novo sistema de ensino começou a ser implementado este ano de maneira progressiva. O cronograma oficial inicia em 2022, contemplando os alunos do 1° ano do ensino médio, sendo essa a primeira geração de alunos alcançados.
A partir desta mudança, a BNCC será elevada com o aumento da carga horária e com a adesão de novas matérias obrigatórias no ensino básico em todo país, além da oferta de possibilidades aos alunos: os itinerários formativos ou a formação profissionalizante. Este modelo permite que o aluno receba o certificado de ensino regular e o certificado de curso profissionalizante ou técnico.
Esse novo pilar do ensino, vai se refletir também na aplicação do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), que sofrerá mudanças. A partir de 2024, as provas do exame serão divididas por área de conhecimento, escolhida pelo estudante, assim como os itinerários informativos, além de contar não apenas com questões objetivas de múltipla escolha, mas também com questões discursivas.
Dentro das modificações na estrutura do ensino, está um componente estratégico para a materialização do Novo Ensino Médio: o Projeto de Vida. A proposta do novo sistema educacional busca impulsionar o aluno não somente para o mercado de trabalho, mas também para desenvolver o pensamento crítico, a autonomia e a tomada de decisões. Assim, em entrevista com a professora e doutoranda em Educação Carla Aragão, a docente nos conta sobre a definição de “Projeto de Vida”:
“Projeto de vida é incentivo ao aluno mais autônomo, assim, a ideia que seja uma disciplina ou mais transversal dentro da escola, porque as escolhas que o estudante vai fazer dentro do ensino médio ficaram mais fortalecidas à medida que dialoga com que ele desenhou o projeto de vida dele.”
Quando perguntada sobre a importância do componente e a adesão dos alunos em sala de aula, a Professora Andrea Rosa, de Jacobina, respondeu:
“Quando eu parto para dimensão pedagógica, e que eu falo sobre o componente curricular ‘Projeto de Vida’, então eu vou dizer que é um componente que trabalha com os estudantes com a intenção de fazer os refletir sobre a sua própria vida sobre a sua própria pessoa, sobre seus desejos, seus sonhos, as suas trajetórias.”
“E eles gostam, mas volto para você, é complexo porque é você mexer na essência do outro. É como um professor chegar para te perguntar. Ele pediu para você fazer e traçar a sua narrativa de vida, não é tão simples, é mais fácil falar das outras coisas das outras pessoas, mas falar de nós não é fácil.”
Período de transição e volta às aulas presenciais
O retorno das aulas presenciais veio junto a uma série de novidades, para além da demanda relativa à adequação à nova base curricular, o sistema educacional começa a enfrentar os reflexos do período pandêmico. É o que comenta Ricardo Nascimento, diretor do Colégio Estadual Governador Lomanto Júnior.
“Todo o déficit educacional já existia, mas de repente a pandemia ou ela evidenciou, ou ela agravou aquilo que já existia.”
O diretor também enfatiza que ainda é cedo para dizer quais serão os reais danos provocados pela pandemia aos alunos e ainda mais sobre a funcionalidade do novo sistema de ensino. Entretanto, quando perguntado sobre os benefícios do modelo de ensino médio, o diretor, sabendo da realidade dos colégios estaduais, se mostrou preocupado com fatores relativos à evasão escolar e as novas disciplinas.
“Ela (a nova base curricular) dificulta o estudante que, por exemplo, precisa trabalhar. A proposta do novo ensino médio com a ampliação da carga horária já traz um dificultador. E também com a questão das disciplinas eletivas ela trabalha de certa forma de maneira seletiva. Apesar de se chamar eletiva, trabalha de forma seletiva. Por que é muito fácil para uma pessoa que tem uma base, uma fundamentação familiar e uma base educacional já sólida, já consolidada, já construída de forma equilibrada e harmônica, desde a educação infantil chegar no ensino médio e ter condições de antecipar o que já acontece na universidade. Escolher uma área para se aprofundar e se aperfeiçoar.”
Como parte da flexibilização curricular serão introduzidos novos componentes, como o já citado anteriormente, Projeto de Vida e Cidadania, e Iniciação Científica. Essas duas disciplinas não exigem uma formação específica dos professores, entretanto questionamos a entrevistada Andrea Rosa se os docentes recebiam algum tipo de curso para auxiliar no oferecimento das disciplinas, ela afirma que, apesar de promissor, o incentivo a formação de novos professores ainda é carente.
Carla Aragão, jornalista e doutoranda em educação, que atualmente dá aulas de capacitação para professores na área de projeto de vida; quando questionada também sobre a formação dos professores, menciona que apesar da existência de cursos de formação estes não são obrigatórios.
“São por adesão. Você não pode obrigar o professor a fazer uma formação. Claro que você tem mecanismos de fazer com que ele pense sobre a importância disso, até porque, ele é remunerado na sua carga horária para planejamento para estudo então. Em geral, os professores assumem esse compromisso. De aderir às formações continuadas oferecidas.”
Ainda sobre esse assunto o diretor Ricardo Nascimento comenta:
“São formações que não constroem uma segurança pedagógica para se atuar no novo ensino médio. […] Vai se aprender fazendo. Ainda não se sabe por que nós estamos iniciando o trabalho do novo ensino médio agora, uma coisa extremamente recente, a gente não sabe nem se vai dar certo.”
Todo o processo de transição tem previsão, de acordo com o calendário do Ministério da educação, para ser concluído em 2023. O professor Ricardo Nascimento acredita que só a partir daí vai ser possível entender de forma clara quais as consequências desse novo modelo de ensino, mas logo no início da entrevista destacou:
“Na realidade da escola pública, a proposta do novo ensino médio não atende de forma ampla e adequada às necessidades, as dificuldades e as potencialidades inclusive dos estudantes de escola pública.”
Por fim, Carla terminou sua entrevista com entusiasmo para a implantação do novo Ensino Médio e suas vertentes, mas também lançou uma ressalva, afirmando:
“Com a importância da educação para ele (estudante) mesmo, o seu processo de desenvolvimento pessoal, para o seu processo de desenvolvimento como cidadão no mundo com o futuro profissional (…), mas assim o alerta é não nos percamos na proposta que o novo ensino médio e o projeto de vida traz.”